#47

Um anjo de pedra branca, cujas pontas das asas se fundem, na luz de Inverno, com o alto penhasco cor de falcão que fica atrás da aldeia - este anjo de pedra segura o pulso de um soldado, cujas pernas já desistiram, e que cai para a morte.  O anjo não o salva, mas parece aliviar a queda do soldado. E no entanto, a mão que segura o pulso não tem peso e não é mais firme que a mão de uma enfermeira que mede uma pulsação. Se esta queda parece estar a ser aliviada é apenas porque ambas as figuras foram esculpidas do mesmo pedaço de pedra.

#46

Se eu retirar as cabeças da fotografia dos cinco homens na sala dos paineis de madeira, ela deixa de ser incriminadora. Só vemos as roupas curtas, as mãos, os colarinhos abertos. Mas sem cabeça, os seus corpos estão presos no presente dos seus torturadores.... Ahmed, Salib, Mehmet, Deniz, Kerime... vai acabar.

#45

Quando se diz que algo é intolerável, devem seguir-se as acções. Estas acções estão sujeitas a todas as vicissitudes da vida. Mas a esperança pura reside primeiro e misteriosamente na capacidade para nomear o intolerável como tal: e esta capacidade vem de longe - do passado e do futuro. É por isto que a política e a coragem são inevitaveis. O tempo dos torturadores é agonizante mas exclusivamente presente.

#44

Eles sabem que na Anatolia nunca houve um Inverno sem neve, um Verão sem animais que morrem da seca, um movimento operário sem repressão. As utopias existem apenas nos tapetes. Mas também sabem que aquilo a que foram sujeitos na sua vida é intolerável. E o nomear do intolerável é, em si mesmo, a esperança.